Metafísica, Política, Humanismo, Filosofia geral e outras questões
Sínteses das realizações d'alguns questionadores...

domingo, 31 de outubro de 2010

O pior dos animais

Em nossa ignorância conquistamos um título até então inexistente na natureza: o único animal maldoso

"Que ingenuidade, que pobreza de espírito, dizer que os animais são máquinas privadas de conhecimento e sentimento, que procedem sempre da mesma maneira, que nada aprendem, nada aperfeiçoam! Será porque falo que julgas que tenho sentimento, memória, ideias? Pois bem, calo-me. Vês-me entrar em casa aflito, procurar um papel com inquietude, abrir a escrivaninha, onde me lembra tê-lo guardado, encontrá-lo, lê-lo com alegria. Percebes que experimentei os sentimentos de aflição e prazer, que tenho memória e conhecimento.Vê com os mesmos olhos esse cão que perdeu o amo e procura-o por toda parte com ganidos dolorosos, entra em casa agitado, inquieto, desce e sobe e vai de aposento em aposento e enfim encontra no gabinete o ente amado, a quem manifesta sua alegria pela ternura dos ladridos, com saltos e carícias. Bárbaros agarram esse cão, que tão prodigiosamente vence o homem em amizade, pregam-no em cima de uma mesa e dissecam-no vivo para mostrarem-te suas veias mesentéricas. Descobres nele todos os mesmos órgãos de sentimentos de que te gabas. Responde-me maquinista, teria a natureza entrosado nesse animal todos os órgãos do sentimento sem objectivo algum? Terá nervos para ser insensível? Não inquines à natureza tão impertinente contradição." Voltaire, em "Dicionário Filosófico"



 Muitas vezes julgamos "má" determinada atitude d'algum animal. Me pergunto se não somos nós os únicos (ou pelo menos os que muito melhor o fazem) animais que podem fazer um mal?


Porque, se há uma coisa que amesquinhe tanto determinada atitude de algum ser, esta é ter este a capacidade de razoar — que implica praticamente numa obrigação de emitir os mínimos juízos antes de agir — e ainda assim cometer gravíssimos e totalmente desnecessários/evitáveis erros. As vezes me pergunto se não seria mais racional um mundo sem nossa espécie (a resposta me envergonha). Não imagino um cão ou uma raposa cometendo tamanhos absurdos. Chimpanzés e golfinhos usam mais decentemente o que possuem do que nós! Talvez a nossa prepotência, que parece ter nascido com o primeiro homo... sim... a nossa prepotência talvez tenha nos envenenado tanto... Mas de que inferno surgiu tal prepotência? É a prepotência atributo nativo do homem? Pôr o próprio ser, e em segunda instância, a própria espécie no centro das atenções, no objetivo de todas as atuações, não me parece mesmo fora de uma realidade que favoreça este ser e esta espécie, segundo o crivo da seleção. Lutar por manter a si mesmo e a própria espécie é natural. Mas já não passamos desta idade? Malditos nos tornamos quando recebemos a razão, mas preferimos também continuar nos vendo como irracionais e consequência da realidade externa a nós (a natureza), a qual insistimos tanto que não temos controle. Realmente, não temos controle sobre a natureza como, em nosso orgulho, queríamos ter, mas será que não estamos mesmo querendo demais? Será que não nos falta olhar o que somos capazes de fazer, o que somos, com nossa racionalidade, capazes de mudar e de fato, sem rodeios, agir, agir assumindo decentemente a própria responsabilidade enquanto ser racional?

Somos mesquinhos por querermos ser filhotes irracionais, perece que queremos mantermos-nos crianças. Queremos mesmo, por isso agimos desta maneira, por isso somos maus — por que só queremos — não somos tão bons a ponto de sermos, ainda adultos, tão puros e honestos com o que somos e temos quanto às crianças. Já estamos a corromper até as crianças! Qualquer outro ser doutra espécie é mais honesto do que nós, e sabemos disto, mas insistimos e ampliamos a sujeira de nossa ficha mantendo-nos nesta mesma linha de atuação em prol da mesquinhez dos desejos provindos de nossa ignorância, ignorância que hoje, para nos envergonhar mais, já vem sendo praticada 'conscientemente'. Caso não entenda o que seja ignorância 'conscientemente' praticada lembre-se dos casos em que se avisa com fins de prevenção a respeito de algo, mas mesmo assim, tendo ciência do perigo ou do risco, o ser insiste em manter ou iniciar uma determinada pratica ou levar a cabo determinado querer no que, obviamente, na maioria dos casos leva a danos, sejam quais forem. Pior é quando seguem-se as reclamações dos ignorantes 'conscientes'... enfim.

 Se ainda resta dúvida sobre o quão "bons" somos no que fazemos, que é o mal à vida e à Terra, medite sobre o tamanho da inteligência que há por trás do que se representa nas fotos a seguir...







Pelo que parece, há um principio de proporcionalidade nisto tudo, e ele é simples: O quão maior é a capacidade mental de uma espécie, maior é a possibilidade desta espécie ser a mais burra e a mais má. Enfim, só nos cabe orgulharmo-nos de sermos tão mentalmente capazes?
Penso que antes de assumir qualquer lisonja própria, temos de assumir toda a responsabilidade do que somos e reconhecer todo o potencial destruidor que temos, para assim delimitarmos toda a nossa área de atuação. Liberdade que não reconhece responsabilidade não é liberdade.

Somos a única espécie realmente má; má pra vida, pro planeta e pra nós mesmos, óbvio. Tendo reconhecido isto, nos cabe, segundo as possibilidades individuais, agir segundo a dignidade que nos é cobrada por nós mesmos por esta faculdade que chamamos razão. Ou será mesmo que não somos cobrados por esta mesma razão, dentro de nós mesmos?

Sobre os outros animais, os mais decentes, e a consideração que merecem de nossa parte pela sua decência, brindo-os com um vídeo expositor da Declaração Universal dos Direitos dos Animais.


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Da exemplar imoralidade ateísta

Segundo o cristianismo e os cristãos...

O ateu, segundo as escrituras bíblicas, é um tolo e nocivo por natureza.

"O tolo diz em seu coração: 'Não há Deus". Eles são corruptos, eles dizem coisas abomináveis, não há nenhum deles que faça o bem" (Salmos, 14: 1).

O ateu, segundo as escrituras bíblicas, é um louco e despreza o conhecimento.

"O temor do SENHOR é o princípio do conhecimento; os loucos desprezam a sabedoria e a instrução." (Provérbios, 1:7)

O ateu, segundo as escrituras bíblicas, tem um coração insensato e obscurecido. Ou seja, possui 'sentimentos' mesquinhos e baixos, se dizem sábios (e não demonstram isso) e reforça-se: são loucos.

"Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios tornaram-se loucos" (Romanos, 1:21-22)

O ateu, segundo as escrituras bíblicas, não são ovelhas (ao menos isso parece bom).

"Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecidoAssim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai, e "dou a minha vida pelas ovelhasAinda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor" (João, 10:14-16)
"Mas vós não credes porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem" (João, 10:26-27)

Líderes nazistas ao lado
de líderes cristãos
Além do que, segundo a visão comum cristã, o ateísmo é causa de diversos extremismos ideológicos doutros tempos que mataram milhares e atualmente, com o advento desta nova ameaça que é neo-ateísmo, tem-se aumentado consideravelmente o risco de surgimento novos extremismo que levem a humanidade a mais mortes e a um sofrimento ainda maior.¹ Os espíritas, e muitas outras religiões, têm uma visão muito semelhante a cristã no que diz respeito ao mal que é à sociedade o ateísmo (e consequentemente os ateus).³

Os cristãos também, como algumas outras religiões preocupadas, têm construído sistemas de sugestões e regras aos quais trocados entre eles propõem-se ao fim de garantir a firmeza (rígidez) da fé que defendem.

Trecho de um "guia" destes: http://www.estudobiblico.org/artigos/o-cristao-frente-ao-movimento-ateista

Em suma, como todo o discurso cristão, sugere-se aos seguidores desta religião portarem-se com indiferença frente a um ateu, ignorando seu discurso em função da própria "fé no evangelho", que é mais virtuosa o quão mais teimoso e cego consegue ser o crente.

Como foi visto, o ideal cristão é totalmente preconceituoso, desde suas raízes (segundo as cópias das escrituras bíblicas que temos publicadas hoje) até o ativismo daqueles que se atiram como defensores de Javé, com "inofensivas" manifestações da "liberdade de expressão", em apologias publicadas na web ou noutros meios de comunicação (como a televisão, com personalidades como o alarmista Datena ou cenas de novela, como a do capítulo 80 de "Ribeirão do Tempo", transmitida pela TV Record²).

Alguns tolos, loucos, seres de sentimentos baixos e "não ovelhas"


Realmente estes ateus não parecem ovelhas; talvez porque sejam seres humanos e não ovelhas de fato.

Dentre este imenso grupo de tolos, loucos e maus, estão por exemplo:

Carl Sagan
"É provável que, se você veio aqui para se juntar a mim em um ato de recordação neste décimo aniversário da morte de Carl, você já conheça bem as numerosas realizações científicas e culturais do homem. É provável que você saiba que ele desempenhou um papel principal na exploração de nosso sistema solar, que ele acrescentou algo a nosso conhecimento das atmosferas de Vênus, Marte e Terra, que ele abriu caminho a novos ramos de investigação científica, que ele atraiu mais pessoas ao empreendimento científico que talvez qualquer outro ser humano e que ele era um cidadão consciencioso tanto da Terra como do cosmo. Talvez você seja um de muitos que foi levemente empurrado a uma trajetória de vida diferente pela atração gravitacional de algo que ele disse ou escreveu ou sonhou. Em minha estimativa parcial, ele era uma figura histórica mundial que nos incentivou a deixar a espiritualidade geocêntrica, narcisista, “sobrenatural” de nossa infância e abraçar a vastidão — amadurecer ao tomar as revelações da revolução científica moderna de coração."Ann Druyan (esposa de Carl Sagan, em pronunciamento na cerimônia em honra ao décimo aniversário do falecimento deste ilustre cientista)


Yoko Ono ao lado
de seu marido
John Lennon
"Imagine que não há paraíso. É fácil se você tentar. Nenhum inferno abaixo de nós. Acima de nós apenas o céu. Imagine todas as pessoas. Vivendo para o hoje" Trecho da canção 'Imagine'
John Lannon foi o fundador da banda The Beatles (Liverpool, Inglaterra, 1960), onde, ao lado de Paul MacCartney formou uma das mais famosas duplas de compositores de todos tempos numa das maiores, senão a maior, banda de rock jamais formada.
Mas não foi só na música que esse proeminente artista se manifestou; Lennon, mesmo após mais de duas décadas de sua morte (assassinado aos 40 anos), é referência entre os mais famosos pacifistas. Tal reconhecimento provém de atitudes como a devolução de sua medalha de Membro do Império Britânico à Rainha Elizabeth como forma de protesto contra o apoio da Grã-Bretanha à guerra do Vietnã. Além disso, posteriormente, ao lado de Yoko Ono (artista plástica da vaguarda que conheceu numa exposição sua esposa), compôs músicas e participou de atos que usavam palavras de ordem como o “Power to the people” (poder para o povo), e ainda realizou em sua lua de mel com Yoko o famoso Bed-In For Peace, quando ficaram por uma semana na cama, num hotel em Montreal, para protestar contra a guerra do Vietnã e pedir pela paz.



Onde está a moral?

No estado mental em que nos encontramos — assim como nos que estiveram a humanidade noutros tempos — seria insensato admitir que há numa ou noutra ideologia, numa ou noutra nação, ou mesmo, na ausência de ideologia ou de nação a "melhor moral". A melhor moral, pelo que penso, é a que atende melhor a humanidade como um todo, então não a vejo por hora em nenhuma ideologia ou nação. E quando digo melhor, refiro-me a "mais humana" (a mais afim com o humanismo).

É fato que podemos encontrar milhares de bons seres sob templos, tal como fora de qualquer sistema religioso; existem homens que salvam vidas em nome de algum deus, e existem homens que salvam vidas sem invocar ou crer em qualquer deus. Existem homens que matam em nome de algum deus e outros que matam em nome de 'si mesmos', em nome de uma nação ou time de futebol. A questão é que não há sentido no julgamento que se tem feito e se vem fazendo desde remotos tempos a respeito daqueles que não acreditam em qualquer deidade. Uma pessoa não é ruim por não acreditar em algum deus. Mas há algo que deve ser considerado neste instante: uma boa pessoa pode fazer coisas ruins em nome de algum deus. Disse "pode" porque não é uma regra, obviamente.

Não é comum ver ateus fazerem mais do que convidar a reflexão ou ao questionamento quem tenha uma aferrada ou estranha crença (seja esse convite feito num artigo, num documentário, em livros ou pessoalmente), a teofobia e a religiofobia são menos comuns entre ateus que em qualquer outro grupo, ao passo que, esta última [a religiofobia] é mais comum entre as próprias religiões, que defendendo cada uma a sua fé ignora e subjulga qualquer forma de pensar diferente, podendo até, como temos visto, cometer assassinatos em massa (ou não) em nome desta ferrenha (e estranha) fé. Além do que, como vimos, escrituras religiosas (como o mostrado inicialmente na bíblia) fazem apologia não só a religiofobia mas também a ateofobia, o que deveria parecer insensato diante de qualquer olho são.




Há uma pequena lista com mais alguns conhecidos nomes, de não-teístas disponibilizada no link http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_N%C3%A3o-te%C3%ADstas_famosos.


"Por simples bom senso, não acredito em Deus. Em nenhum." Charles Chaplin


[1] Um pouco mais da visão cristã (ou dos cristãos) no que diz respeito ao ateísmo:
http://www.cacp.org.br/movimentos/artigo.aspx?lng=PT-BR&article=435&menu=12&submenu=2
http://www.gospelminas.com/Noticia/1357/MOVIMENTO+ATEISTA+TROCA+BIBLIAS+POR+REVISTAS+PORNOGRAFICAS.html
http://www.diariodemarilia.com.br/Noticias/88245/Papa-lembra-nazismo-e-critica-extremismo-ateu
http://www.ejesus.com.br/exibe.asp?id=3442
[2] http://www.youtube.com/watch?v=Y0DDIDI23KI (a partir do minuto 2:00)
[3] Síntese da compreensão espírita de ateísmo: "O ateísmo é o inverso do Espiritismo, pois, em sua doutrina nega a existência de Deus. Daí a sua perniciosidade para a sociedade humana. Figurando a questão poderíamos dizer que o ateísmo é o veneno e o espiritismo o remédio." Bernardino da Silva Moreira (http://www.portaldoespirito.com.br/portal/artigos/bernardino/espiritismo-ateismo.html)

domingo, 24 de outubro de 2010

Pirâmide do Capitalismo

Compartilho esta interessante retratação da pirâmide capitalista.

Um ensaio sobre a política nas bases

Bases...
Do que seriam essas bases?
Que bases seriam essas?
Questões que necessariamente precisam de resposta antes de uma abordagem sobre o assunto proposto. Esforcemos-nos, então, por entendê-las e por ventura respondê-las.


Das bases de uma sociedade

Faz parte da constituição de uma sociedade a cultura, e se constitui essa de seres que criam, expurgam ou reproduzem pensamentos. Seres formam-se, em suas bases (ou na ausência delas) intelectuais, morais, e de aspirações éticas desde praticamente suas concepções, e o quão próximos estejam desta (ou seja, o quão mais novos sejam) mais sujeitos estão naturalmente a interferências alheias em suas formações (por motivos já esboçados no post O Medo como Força mental (Primeira Parte)). Em especial é fácil notar que são esses períodos iniciais que marcam no ser aquelas das mais profundas impressões que carregará este por praticamente toda a vida, só promovendo grandes mudanças em seus conceitos em ocasião de considerável impacto (certas vivências, pessoas que por ventura venha a conhecer, conhecimentos que receba ou mesmo entendimentos que alcance por próprio esforço em sua reflexão). Muitos concluiriam que é óbvio que, então, ninguém jamais permanecerá com aqueles conceitos provenientes daquelas impressões dos primeiros anos de vida, visto que, é fácil admitir que praticamente todos conhecem outras pessoas e têm contato com conhecimentos durante suas vidas, mas, seria leviana tal conclusão sob a perspectiva que nos mostra que a maior parte das pessoas pensa de forma muito semelhante, e isso porque foram e são criadas de forma semelhante, todas sob o teto da cultura e moral de seu povo ou tempo, e muitas, elos nas correntes de tradição a que seu povo pertence.


“Planejadamente” pôs-se em paralelo a essa etapa que é a infância e às etapas posteriores, a pré-adolescência e a adolescência, o serviço de educação escolar, promovido por instituições competentes e financiado pelo povo como um todo (através do recolhimento de impostos promovido pelo Estado) ou diretamente pelos “responsáveis” ao ser em formação; respectivamente os colégios públicos e privados. Então o ser em idades formativas conta não só com seus pais, familiares e ocasionalmente vizinhos (além da mídia) como agentes inculcadores de conceitos, mas com tais instituições que reúnem pessoas diferentes e necessariamente faz com que os conceitos se cruzem, permitindo ao ser transcender alguns dos preconceitos familiares ou dos arredores de sua morada. É este o potencial direto da escola como agente socializadora, e são nessas pequenas misturas de pessoas, teoricamente, diferentes promovidas nos ambientes escolares que brilha, mesmo que por hora não muito, a possibilidade de mudança e superação considerando a união de seres individuais. Havia dito “teoricamente”, considerando que pensamentos de massa podem agir por exemplo em formas que vão desde meras modas a assustadores fanatismos, levando grupos inteiros a assumirem personalidades tão semelhantes que nos põe realmente em dúvida, em nossas análises, a diferença que haveria entre estes.


Estando as tenras idades dentre as épocas que mais influenciam sobre as bases conceituais (incluamos moral e aspirações éticas nestas) do ser; sendo as instituições de educação escolar paralelas a estas exercendo grande influência nestas; sendo os seres os mantenedores da cultura, e sendo esta junto aos seres o que constitui uma sociedade, então, temos as instituições escolares exercendo grande influência nas bases da sociedade, isso se não colocar-mos-na como uma base mesma das sociedades atuais.


Compêndio sobre a origem da escola

Desde a antiguidade, quando se começa transmitir abertamente o conhecimento, inicialmente em praças públicas, especialmente com os gregos, a instituição escolar vem ganhando cada vez maior importância no seio da humanidade. Dentre os grandes saltos na história da escola está o que se promoveu na idade média, disparado pelo rei, e posteriormente imperador, Carlos Magno (mais conhecido pela restauração do Império Romano Ocidental), e em grande parte influenciado também pela da Igreja, que em seu plano de conquista e expansão defendia que “(...)é preciso estudar a Bíblia para chegar a Deus, e as palavras da liturgia não toleram imprecisão. Cabe à Igreja atrair fiéis, que devem conhecer as preces e os preceitos”. 


Estas escolas medievais são iniciadas nos monastérios beneditinos e expandem-se posteriormente às cidades,  dirigidas estas últimas por eclesiásticos dependentes diretamente dos bispos. Tais eclesiásticos eram denominados Officium Scholasticus, título dado a um mestre da ciência e cultura medieval encarregado de transmiti-las, ou a alguém que se propunha à tentativa de resolver os problemas relacionados a fé e razão. Por tal, tais escolas difusoras do pensamento medieval ficaram conhecidas como Escolástica. Na escolástica preserváva-se a difusão das sete artes liberais propostas no plano de Carlos Magno e seu conselheiro, o monge beneditino Alcuíno de York. Eram estas artes dividas em dois grupos: o Trivium (gramática, lógica e retórica) e o Quadrivium (aritmética, geometria, astronomia, e a música).


Naturalmente a política de Carlos Magno, que promoveu a primeira considerável expansão escolar, focou antes de tudo os interesses deste governante: unificar e fortalecer o seu império através da educação — realmente um nobre interesse, temos que admitir. Obviamente, assim como o nascimento das grandes instituições de ensino escolar, o futuro, a manutenção e a construção de novas escolas ficariam a cargo dos governantes de cada época, e a política continuaria então sendo uma camada gerenciadora dos colégios, convencionando o currículo destes — delimitando mínimos e máximos no exposto aos estudantes —; cada governante em seu reino, império ou posteriormente nação.



Compêndio sobre política e o que há de comum no seu emprego nesta e noutras épocas

Política é o nome dado à ciência da organização do povo.
Entre os muitos fatores que a originaram se encontra a necessidade administrativa correspondente ao advento da pólis, a cidade-estado, na Grécia Clássica.


Desde seu advento a política, como as outras ciências, passou por grandes mudanças, e não foram poucos os momentos de grande sofrimento os passados pela humanidade em diversos povos, causados pelos experimentos políticos que haveriam de ser promovidos por seus líderes em diversos momentos históricos. Entre as medidas mais tomadas por líderes políticos durante a história, encontramos as guerras.


Talvez por ser uma das ferramentas de controle, conquista, enfim, alcance de objetivos mais antigas, remontando-nos às lutas na própria vida, entre espécies ou grupos de uma mesma espécie, a guerra seja nos experimentos políticos um dos utensílios mais usados. Na verdade, se bem analisar-mos, vemos que as guerras são as decisões políticas mais covardes, porém é de se considerar que não há alternativa entre líderes que não vêem além da própria covardia, indiferença e egoísmo. Não seria uma atitude realmente digna de um líder promover algo que o povo tutelado não tivesse condição de promover? Se não, o que então faz este governante merecer o olhar de respeito por sua liderança, visto que não faz nada além do que alguns no seu povo também não fariam?


Retalhar não é o que faz um brutamontes quando não concorda? Então porque este também não tem um povo aos seus pés, bancando-lhe?
A diferença entre estes brutamontes, o líder e o liderado, é que o primeiro é custeado a ponto de poder retalhar quem discorda de uma forma muito mais ampla, movendo até a ciência na construção dos engenhosos brinquedos usados na coerção, no ferimento e no assassinato de milhares, assumindo assim também uma alta capacidade de subjugar povos inteiros a seus interesses, que são os do inculto liderado elevados a enésima potência. Ainda estamos pra ver um mecanismo mais bárbaro e simplório de liderança. Assim “liderar” fica mais fácil; e o melhor: há eficácia no atendimento do querer que é praticamente despótico.


Mesmo assim, entendo que muitos dirão que a selvageria dos povos é quem requer selvageria dos governos; mas quem tem a batuta que rege a administração educacional que haveria de enobrecer os povos? Ou ainda há dúvida quanto ao potencial enobrecedor das escolas, mesmo após analisarmos as instituições de ensino, em especial a escola, como elemento de excepcional influência nas bases formativas da sociedade¹? É evidente que a manutenção da identidade de um povo é promovida pela educação (novamente, em especial, a escolar), que mantém viva a alma de uma sociedade. Análogo ao que expôs Émile Durkheim, um dos pioneiros da Sociologia, as instituições de ensino também, mais do que formadoras da sociedade, são produtos dela.


Tendo visto o poder transformador (ainda pouco usado) que tem a política com as instituições de ensino e, em contrapartida, a baixeza que essa mesma política do zeitgeist mantém ao empregar o arcaico mecanismo da guerra (agora não mais uma premência natural, e sim, como temos visto, um interesse e ainda mais, uma necessidade corporocrática), analisemos a razão da política empregada neste e noutros tempos, o que deveria ser óbvio, para então, em seguida, entendermos mais acertadamente as causas mais evidentes de não termos ainda em nossas salas de aula o estudo da ciência política:


A política praticada é exercida por poucos e para poucos, à maioria restando o discurso político do bem comum, que logicamente não prioriza as dimensões do indivíduo (sendo estas, quando enveredadas por alguns do povo, por inofensivos e incontroláveis "acidentes") mas constroe sobre este um modelo social e cultural implantado e mantido pela educação que por sua vez é implantada e mantida por aquela elite governante.


Esboço de uma proposta à educação política

Em 24 de abril de 1962, pouco antes do golpe militar, no Brasil de João Goulart e do primeiro-ministro Tancredo Neves, o Ministério da Educação e Cultura, entre as diversas disciplinas do currículo recém elaborado, oferecia entre as disciplinas obrigatórias uma disciplina chamada Organização Social e Política Brasileira (OSPB).


No artigo do conselheiro Newton Sucupira podemos notar um pouco do clima em torno de tal acontecimento:


Ela tem como finalidade proporcionar ao aluno uma idéia adequada da realidade sócio-cultural brasileira em sua forma e ingredientes básicos. Deverá, pois apresentar o quadro geral das instituições da sociedade brasileira, sua natureza, formação e caráter, bem como as formas de vida e costumes que definem o modo de ser específico e a fisionomia característica de nossa cultura. Será além disso, um estudo da organização do Estado brasileiro, da Constituição, dos poderes da República, do mecanismo jurídico e administrativo em suas linhas gerais, dos processos democráticos, dos direitos políticos, dos deveres do
cidadão, suas obrigações civis e militares.


De acordo com o Decreto de Lei 869/68, passa a ser obrigatória no currículo escolar a OSPB assim como a EMC (Educação Moral e Cívica), em substituição as disciplinas Filosofia e Sociologia. Neste contexto o ensino focava os fatos em detrimento da reflexão e da análise. Além disso existem aqueles que o digam que a ideologia patriota e o civismo pervertido que impregnava aqueles anos eram difundos aos alunos por tais disciplinas. Foi por entre essas e outras coisas que em 1996, estabelecida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que pelos Parâmetros Curriculares Nacionais condenou-se as duas disciplinas por estarem embebidas de um “caráter negativo de doutrinação”, assim, se extinguindo ambas do currículo escolar. Muitos estudiosos consideram não menos que radical tal atitude, pois viam a possibilidade de manter essas disciplinas excluindo-se delas o caráter ideológico que animou a ditadura.


Vemos então que já implementou-se disciplinas de caráter político e cívico em instituições de ensino brasileiras, porém, ficou evidente o interesse político da época que justificou a adoção de tal medida? Ficou evidente também o motivo pelo qual aboliu-se após alguns anos de termino da ditadura estas disciplinas ao invés de simplesmente adaptá-las à mudança governamental?


Evidente que se o povo entende de civismo e política passa a observar melhor o que se passa na esfera política de seu país e consequentemente passa a exigir mais, porém, se é possível ganhar mais e com menor dificuldade além de ter menos preocupações com a contenção/manipulação de mais cabeças em sua maioria não pensantes, porque realmente, sendo um governante, se manteria e atualizaria tais disciplinas?


O escritor baiano Irineu Tolentino, considerando a globalização, propõe não só o retorno de disciplinas deste tipo, como também uma atualização inclusive no escopo destas. Propõe que não só retorne-se às escolas a OSPB mas sim que esta transforme-se em OSPM: Organização Social e Política Mundial.


Penso que o estudo da Ciência Política nos colégios deve ser levado a cabo, e ao contrário do que aconteceu em 1962, onde exclui-se a Filosofia e a Sociologia dos colégios para a implementação do novo currículo, um currículo novo deve não só manter mas também aproximar ainda mais estas disciplinas que podem avaliar tão bem e diversificadamente as facetas da política, juntamente com a análise histórica e geográfica que já vem sendo feita pelas respectivas disciplinas.


Há ainda muito o que se discutir porém sempre estamos atrasados quando o assunto é formação do povo e superação da ignorância reinante.


Obstáculos à prática da educação política

Resolvamos os problemas:
"Panem et circenses" !
Como vimos a escola é formadora ao mesmo tempo que é formada pela sociedade; o contexto histórico e logicamente cultural desta [sociedade] envolve a escola. Então vejamos: se o sistema econômico de um povo ou o predominante numa época influi diretamente nos hábitos, nas vivências individuais, no convívio, na moral, enfim, em toda uma cultura e sociedade então este influi também nas instituições de ensino, óbvio, inclusive adaptando-se estas às necessidades deste sistema. Olhemos então para o nosso sistema e vejamos se não é uma das maiores de suas necessidades o trabalhador, o operário, a mão-de-obra, que produz, no chão das fábricas ou nas grandes construções o lucro, e com menor premência, seguidos pelos que se preparam para o setor terciário, assim como os que liderarão nas esferas científicas os avanços necessários para a perpetuação dos mecanismos de manutenção (lucro) do sistema. São os trabalhadores e os consumidores as colunas do sistema em voga, e por tal, obviamente nada sob o sistema pode apontar a quebra destas colunas. "Não é bom que nenhuma escola nem nada na mídia incite o não consumismo e a não servidão." Não é difícil  ver os interesses corporocráticos enfluenciando as escolas, o que seria mais um elemento justificador do não ensino político nestas. Considerando a escola, sociologicamente, como um agente propagador de uma sociedade no tempo, então não cabe a ela, em primeira instância, ferir o estabelecimento (ou sistema, como preferirem alguns). Como o governo e a política praticada logicamente fazem parte deste estabelecimento, então não ser “prejudicial” ao governo é requisito nas instituições de ensino, que antes de tudo também são dependentes dele.

Há nas sociedades de hoje, assim como houveram noutras doutros tempos, um arquétipo piramidal que ainda evidencia desigualdade e mais ainda, servidão, tão desnecessária quanto obviamente injusta, visto que não é mais difícil e economicamente inviável sanar a fome alimentícia e de saber de um povo, que enviar homens em viagens para além da atmosfera terrestre.


Fica evidente que a principio não será disciplina escolar a Ciência Política, pelo menos não com a imparcialidade e a fomentação da visão crítica necessária, pois do contrário, aumentariam óbvia e consideravelmente os que a entenderiam, e seria evidente, pois, que o povo constataria que não é governado como merece e deveria ser.




Algumas indicações:
http://www.eusou.com/premium/cronicas.asp?det=1648
http://secbahia.blogspot.com/2009/03/organizacao-social-e-politica-do-brasil.html
http://serpente-do-eden.blogspot.com/2010/10/um-breve-discurso-sobre-o-voto.html
http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=1034475&tit=O-ensino-da-poli
http://folhadeabaetetuba.blogspot.com/2009/03/teoria-da-piramide-politica.html
http://flageloromano.wordpress.com/2010/06/04/tiberio-e-caio-graco-e-a-justica-solitaria/

1.Como foi visto, neste texto, em Das bases de uma sociedade

Da Imposição

Proponho que o entendimento não é alcançado por via da imposição.

Não há verdadeiro entendimento
por imposição.
Impor é colocar por força na mente (ou interno) de outrem.
Expor é trazer pro comum imediato, que é o externo à mente, algo a ser analisado pelos conversantes.
A imposição se dá quando um proponente ao invés de expor seus argumentos dissecando-os externa e claramente ante aos que lhe conferem atenção, atira-se rumo ao interno dos ouvintes buscando carimbar diretamente na tela mental destes suas proposições. Este ato priva os receptores da oportunidade de análise, que envolve a reflexão e o pensar, que por sua vez naturalmente levantam questionamentos e antíteses na mente do ser que recebe a proposição (neste caso teríamos uma recepção ativa).

A recepção ativa, por envolver em especial as faculdades de refletir e pensar, que laboram conjuntamente, move toda a inteligência. Desta movimentação da inteligência surgem os primeiros pensamentos que mantém a síntese ou conclusão sobre o exposto, chamamos este tipo de pensamento de entendimento, e são de entendimentos que se formam os conhecimentos. Entender seria co-mover as faculdades da inteligência em prol de sínteses ou conclusões. Não considero ao referir-me a conclusões concepções finais, senão, tão só degraus firmes, que nos possibilitam prosseguir subindo esta escada de superação e conquista, então, gradual do saber.

A recepção passiva, que pode ser facilitada por consequência da inércia mental (tema de posteriores abordagens), promove-se quando o receptor (ou seja, aquele que ouve ou é de alguma forma o objeto alvo do proponente em sua narração), privado de alguma forma pelo proponente ou por sua própria realidade interna (seus pensamentos, arraigados preconceitos, deficiências psicológicas, etc), assume uma concepção deste proponente sem prévia análise, sem a movimentação da inteligência (que como dissemos, envolve reflexões, questionamentos e etc) que terminaria com o entendimento, que poderia ser a favor ou contra a concepção proposta. Normalmente utiliza-se da indução à receptividade passiva quando não tem-se bases sólidas que sustentem os argumentos defendidos, do contrário, caso arriscasse-se expor, evidentemente, a base dos argumentos estaria-se pondo em risco de perder a credibilidade nestes argumentos, o que, no geral se teme. Aquele que assumiu-se aleijado não consegue mais considerar, por si só, um dia em que poderá andar sem estas tão adoradas muletas.

Fica claro então que é infecunda qualquer tentativa de real conquista de conhecimento por via da imposição, que neste caso, no máximo, levaria a uma crença. Desta forma entendemos porque existem aqueles que sabem, e sabem que sabem, e existem aqueles que sabem, mas só porque acreditaram no que sabem, são respectivamente os que adotaram as posturas receptiva ativa e passiva — aqueles que entenderam (e com isso formaram real conhecimento) e aqueles que acreditaram (formando com isso suas crenças ou preconceitos, que, claro, não necessariamente estão longe da realidade, dependendo do preconceito ou crença que sejam, mas ainda assim não são mais que isso, preconceitos imaturos ou crenças, cerceadores por natureza). É necessário ter em mente que não é porque uma pedra permite passivamente que se registre nela informação e conhecimento que ela os domina, domina estes quem esculpiu-os na pedra, o ente ativo, aquele que forjou e forja entendimentos.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O Aleijado às Avessas

Contemplo-os humildemente com um pequeno trecho extraído da obra "Assim falou Zaratustra", no discurso "Da Redenção":

"Quando ao sair de minha solidão, atravessava pela primeira vez esta ponte, não dei crédito aos meus olhos, não cessei de olhar e acabei por dizer: 'Isto é uma orelha!. Uma orelha do tamanho de um homem!'.
Acercava-me mais, e por trás da orelha movia-se algo tão pequeno, mesquinho e débil que fazia compaixão.
E efetivamente: a monstruosa orelha descansava num tênue cabelo, e esse cabelo era um homem!
Olhando através de uma lente ainda se podia reconhecer uma cara invejosa, e também uma alma vã que se agitava no remate do cabelo.
O povo, contudo, dizia-me que a orelha grande era não só um homem mas um grande homem, um gênio. Eu, porém, nunca acreditei no povo quando ele me falava de grandes homens, e sustento a minha idéia de que era um aleijado às avessas que tinha pouquíssimo de tudo e uma coisa em demasia."

Friedrich Nietzsche

sábado, 9 de outubro de 2010

O Medo como Força mental

Se o desconhecido pode amedrontar,
então buscar saber é encorajador
Antes de tudo, esbocemos uma definição de força mental, não a ultima, mas por hora uma definição útil. Tenhamos como força mental uma causa capaz de parar, produzir ou acelerar movimentos mentais (ou seja, capaz de agir sobre a inércia mental, desconfigurando o estado de repouso ou de movimento de um ente deste mundo mental). Como movimento mental tenhamos a mudança de posicionamento interno, mudança de estado mental, mudança, purgação ou concepção de pensamentos, sentimentos ou paixões (discutiremos esses entes noutras oportunidades).

Bem, tendo feito algumas razoáveis definições iniciais, entremos no cerne da questão: o medo como força mental.


Pequena análise sobre as origens e desvirtuamento do medo

O temor remonta o nascimento de nossa espécie, o medo por muitas ocasiões nos livrou da morte, e sobre a ótica da seleção natural é ainda mais evidente a causa de, nos dias de hoje, praticamente nenhum indivíduo de nossa espécie ser completamente destemido, restando apenas a esta excepcional casta de "corajosos excessivos" somente aqueles que sofrem de um mal em sua estrutura cerebral. Assim ter medo é uma consequência evolutiva. Neste contexto diría-nos Gandhi que "o medo tem alguma utilidade, mas a covardia não". Mas será que, como muitas coisas desta nossa realidade mental, o medo também não teve sua utilidade natural desvirtuada por posteriores oportunistas de nossa espécie? Não é difícil perceber que sim. Percebeu-se o quão fracos estranhamente podemos ser também diante do medo; os pensamentos de medo são capazes de impor grande pressão psicológica, e um ser muito facilmente pode ser levado a agir contra o que realmente faria caso estivesse livre de tal imposição. Imagine-se com um determinado medo, um grande medo, um medo que acobertasse todo seu tempo, um medo que mesmo em seu inconsciente mantê-se sob seu cerceamento os demais pensamentos que circulam em sua mente... Sente o diminuto grau de facilidade de realização de algo que o pudesse libertar deste aprisionamento mental? Consegue, ainda imaginando, perceber o quão difícil é libertar-se neste caso?

De fato, há de se empregar muita energia em tal labor de libertação, muito tempo é o que parece ser necessário, esforço intenso, quando não quase constante, é o que se precisa em tal situação. Tendo realmente procedido com tal reflexão, o elevado grau de dificuldade que pode assumir a libertação em relação ao aprisionamento do medo mostra-se diante de nossos olhos analíticos; então prosseguiremos sobre outra questão: há capacidade natural e igual a todos os seres de se libertarem neste tipo de situação?


Do aprisionado por seus pensamentos de medo

Tentemos-nos colocar na posição de um pobre infeliz cuja vida adulta projetada por uma infância marcada por abusos mentais configurou-se numa solitária e individual agonia, aparentamos, em nossa hipótese, ser feliz, sorrimos para muitos mas nunca a nós mesmos, rimos de muitas situações alheias mas indignamo-nos e decepcionamos-nos ao ver a nossa própria situação. Nossos processos mentais, subjugados pela psiqueálise¹ são em grande parte infecundos, em fim, nossa vida pauta-se em medos fundamentais e deles não passa justamente porque eles a principio não nos permitem isso. Esse medos ameaçam-nos caso arrisquemos superá-los. De fato, neste interessante mas comum exemplo estaríamos sobre a batuta do medo, e dela tenderíamos a nunca mais escapar. O único fator que nos faria transcender tal domínio seria uma atitude mental ativa — o levantamento de questionamentos, por exemplo —, mas de onde tiraríamos elementos para construir nossos primeiros questionamentos se jamais nos foi concedido se quer a oportunidade de duvidar e levar até o fim essa dúvida, atingindo uma conclusão, a conclusão que seja, mesmo que essa seja a de que ainda não há resposta? Ter elementos para construir um sensato questionamento é essencial, mas paradoxalmente deveria ser impossível então formular um primeiro questionamento, o que não é verdade, obviamente. Então de onde surge os primeiros elementos? Do nada?

Na verdade, em nosso exemplo hipotético, o ser ainda em sua tenra idade teve inculcado o medo, entre outros preconceitos de longa data; em especial, nestes casos, o medo vem de ameaças que tão cedo tal sorte de pessoas recebem, o que as impressiona profundamente visto que por condicionamento natural é realidade nossa aceitar passivamente o que os de mais idade nos expõem, do contrário, entregaríamos-nos aos jacarés ou às violentas correntezas de um rio para comprovar a validade da precaução que nos foi dada — por tal, as crianças que tinham grandes problemas em aceitar ou entender prontamente uma precaução de seus responsáveis fizeram-se terminar em nossa espécie —; e não é outra coisa senão esse medo inculcado ainda na infância o que nos priva de atuar segundo a resposta para esta questão referente aos primeiros elementos para os primeiros questionamentos e reflexões. Os nossos primeiros e fundamentais elementos, após serem "capacitados" na baixa infância vêm logo após essa idade da passividade infantil: esses fundamentais elementos não são mais que as dúvidas, livres, (ou inquietações) que inicialmente fundadas na razão (que mesmo ainda não estando tão treinada, é de fato, a razão, que só requer a principio poder agir livremente) permitem ao ser dar seus primeiros passos com considerável acerto, pois está tendo atitude saudavelmente cética. Daí que temos resolvida a questão dos primeiros elementos para as primeiras reflexões.

Mas por que em nossa hipótese, não supera logo o ser seus medos inúteis? Por que lhe carece elementos; e não voltamos ao inicio da questão, senão, abrimos espaço para uma segunda análise: no estado em que está, o ser não tem estímulos para superar-se, carece-lhe elementos para isso; porque parece que este tende a jamais sair de tal ciclo de vida sob a maestria do medo? O que deve ser feito?


Esboço de uma análise causal do aprisionamento pelo medo

Duas questões que se complementam; duas respostas que se complementam:
O ser parece mesmo tender a jamais sair de tal ciclo por que os pensamentos de medo são ativos e têm influencia considerável sobre a vontade do ser e sobre suas decisões. Nosso personagem, como já dissemos, encontra-se aprisionado por seus medos, e por mais que se julgue livre, não será de fato, e isso até ele em determinados instantes percebe, mas sufoca esses fragmentos de consciência, e até isso o faz por medo. O medo é um poderoso agente nas causas de suas movimentações internas, de fato, responde a primeira questão a simples constatação do medo como força mental.


Uma sugestão de atuação frente às ameaças e mistérios

À segunda questão um ensaio de resposta deveria ficar a cargo do temeroso, visto que, obviamente, medos são pessoais, e embora possam agir numa massa, cada ente tem um traço de si mesmo no(s) medo(s) que carrega, traços das próprias vivência. Porém darei meu humilde parecer, sugerindo àquele que teme algo, seja o que for — e incluo-me nesta lista, e acredito também que está longe de ser pequeno o número de seres que incluem-se nela, se não forem todos, claro —, uma atitude de desafiador "inconsequente" (mas sensato, sempre),  Bertrand Russell sugeriria-nos "(...) olhar francamente para o mundo", visto que, se determinada pressão proveniente do medo ao menos cheira a ilusória, das duas resultantes possíveis teremos uma: ou em verdade veremos que nosso medo é racionalmente embasado, sendo um medo justificado, e ao menos já saímos ganhando por sanar ao menos o medo de estar errado sobre um medo maior que merece realmente nosso cuidado e atenção, ou de fato constataremos a verdade que desmente tal medo, e neste caso, nos libertaríamos de um grande peso que é este agente sugestionador de nosso campo mental, que é um medo, tendo como uma das primeiras e diretas vantagens, o ganho de um espaço mental ampliado para atuações um pouco mais livres, visto que, do livramento de entes que sugestionam a nossa vontade a atos e situações muitas vezes contrárias ao que realmente queríamos vivenciar aumentam-se as oportunidades de atuação de pensamentos realmente pensados sobre um mais livre e honesto querer do próprio ser, e não de pré-concepções vãs que nos fazem escapar às mãos nosso precioso tempo de atuação, nosso precioso tempo de vida, pré-concepções tais como estes muitos pensamentos de medo, que nesta oportunidade foram foco em nosso esboço de uma pequena análise deste importante assunto.





[1] Neologismo logosófico; aplica-se à paralisação de uma zona mental, afetada por preconceitos dogmáticos. (N.T.: A forma  original em espanhol é “psiqueálisis”).

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